A listagem da brasileira JBS (NYSE: JBS) na bolsa dos EUA pode ser exatamente o que o médico receitou

A JBS (NYSE: JBS) (um conglomerado alimentício brasileiro e a maior processadora de carne do mundo) acaba de concluir sua listagem na Bolsa de Valores de Nova York (NYSE), abrindo suas ações para um público muito maior de investidores americanos. A mudança pode ajudar a reparar uma imagem desgastada, à medida que a empresa busca superar um passado repleto de escândalos envolvendo alegações de suborno e violações da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA).
“Entrar na NYSE é motivo de grande orgulho para todos nós da JBS”, disse o CEO Gilberto Tomazoni. “Esse passo fortalece nosso acesso aos mercados globais de capitais e aprimora nossa capacidade de gerar valor de longo prazo para os acionistas.” O diretor financeiro Guilherme Cavalcanti acrescentou que esse novo capítulo exigirá “uma gestão financeira robusta.”
Nenhum novo capital foi levantado durante a transição, e as ações continuarão sendo negociadas em São Paulo na B3, por meio de certificados de depósitos emitidos no Brasil (BDRs).
Fundada há 72 anos por José Batista Sobrinho, a JBS distribui produtos para mais de 180 mercados e emprega cerca de 280 mil pessoas. Nos Estados Unidos, a empresa produz carne bovina e suína, além de controlar grandes marcas do varejo como Pilgrim’s Pride e Wild Fork Foods. 2024 foi um ano excepcional para a empresa, teve crescimento em todas as unidades de negócios, com o Ebitda (Lucro Antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização) ajustado subindo 108% em relação ao ano anterior, atingindo US$ 7,2 bilhões. Antes da mudança para Nova York, as ações denominadas em reais haviam valorizado quase 80% nos 12 meses anteriores na bolsa de São Paulo.
Mas esse impulso é ofuscado por sombras que remontam a 2017, quando a J&F Investimentos, controlada pela família Batista (são detentores de cerca de metade das ações da JBS) admitiu ter pago propinas a autoridades brasileiras para ajudar a garantir um financiamento do governo. A holding de investimentos depois concordou em pagar US$ 256 milhões ao Departamento de Justiça dos EUA para encerrar uma investigação criminal, enquanto a JBS também tem enfrentado fortes críticas em relação às suas práticas ambientais.
Risco aumentado ou a solução?
Um grupo de legisladores americanos mencionou esse histórico conturbado em uma carta enviada à comissão de valores mobiliários americana (SEC) no ano passado, pedindo que o órgão regulador analisasse com bastante atenção os planos de listagem em Nova York. “Durante doze anos, a JBS esteve envolvida em um extenso esquema internacional de corrupção por meio de subornos, além de atividades ilícitas nos Estados Unidos”, escreveu um grupo bipartidário de senadores, entre eles Cory Booker e Marco Rubio (atualmente Secretário de Estado), citando também alegações de abusos aos direitos humanos e monopólio no setor de frigoríficos.
O Wall Street Journal relatou que grandes bancos como Morgan Stanley (NYSE: MS), JPMorgan Chase (NYSE: JPM) e Goldman Sachs (NYSE: GS) se recusaram a trabalhar com a JBS por preocupações de conformidade.
Ainda assim, apesar de todas as preocupações, é justamente o ingresso na bolsa dos EUA que pode ser o remédio. Embora muitos presumam que as valorizações elevadas que podem resultar de uma oferta pública de ações de grande visibilidade na NYSE estejam relacionadas à expansão do grupo de potenciais investidores, o National Bureau of Economic Research publicou resultados, há mais de 20 anos, que demonstravam que existe outro fator importante na equação: listar ações nos EUA reduz a capacidade de acionistas controladores de extrair benefícios privados.
“Empresas cujos acionistas controladores extraem altos benefícios do controle não se listam nos EUA porque fazer isso ameaça sua capacidade de obter esses benefícios,” escreveram os autores Craig Doidge, G. Andrew Karolyi e René M. Stulz em um artigo de 2001. “Consequentemente, as empresas que vão escolher listar nos EUA são aquelas cujos acionistas controladores extraem menos benefícios em comparação com empresas do mesmo país que não fazem essa listagem nos EUA.”
Listar ações nos EUA, em outras palavras, obriga as empresas a obedecer regras muito mais rígidas, e essa transparência (sobretudo quando os acionistas controladores apresentam incentivos que entram em conflito com os dos investidores minoritários) tende a aumentar o valor das ações com o tempo. No caso da JBS, isso pode ser exatamente o que o médico receitou. Em vez de permitir que os controladores internos se beneficiem ainda mais, a NYSE pode fornecer à empresa a disciplina que os maiores acionistas, os Batista, no passado não conseguiram exercer por conta própria.